Para ler ouvindo City And Colour - Meant To Be.
Oi, como vai?
Durante os dias que se arrastaram, travei conversas muito bacanas com amigos sobre o processo de escrita, divulgação e periodicidade. Com isso, foi o primeiro assunto que levei à terapia e, claro, um céu se abriu sob meus olhos.
“O que é a escrita para você, Lucas?”
Eu juro que o exercício foi feito sem muita elaboração. Quis deixar tudo desaguar de maneira honrosa sobre o modelo, a fuga, da maioria dos meus dias de chuvas intensas, alagamentos internos e comportas de segurança levadas pela força das águas da adversidade.
Desde muito pequeno, eu tinha algo com narrativa em minhas mãos. Gibis da Turma da Mônica, revistas da Recreio, revistas sobre jogos e walkthrough… Eu sempre estava em contato com narrativas e gostava de afundar meus olhos e dedicar a atenção às linhas. Na época da escola eu queria aprender a desenhar - quem nunca quis ter habilidade para desenhar mãos bem feitas? Apesar de que, nem mesmo a inteligência artificial consegue…
Sem a possibilidade e a habilidade de dar vazão aos meus rebuliços internos na forma de desenhos, permiti a entrada da escrita em meus dias. Eu tinha um grande caderno, no qual, sem saber elaborar muito bem - já que eu tinha cerca de 13 anos, me permitia rasgar as páginas com palavras que buscavam traduzir o meu eu. Desde então eu me entrego à escrita como fuga e tempo de qualidade comigo mesmo.
Antes, sem a habilidade de elaboração, os textos eram parecidos até nas unidade de vírgulas. Após anos de criação de textos - mesmo que pessoais, e a bagagem da vivência, a elaboração acontece antes mesmo do papel receber as primeiras sentenças. Hoje, algumas angústias que tinham as linhas como foco, conseguem se resolver em breves momentos de epifania.
Mas, afinal, o que é a escrita para mim? É, em sua totalidade, o meu encontro comigo mesmo. É uma conversa, é a discussão construtiva sobre as angústias ainda não categorizadas, é a visita à porta do passado para ver se eu consigo iluminar um pouco mais alguns cantos, é a permissão para me conhecer e gerar a possibilidade de aceitar minhas falhas e qualidades. A escrita, o despejar, é um exercício como o manejar da cerâmica e argila. Com cuidado, cautela, sem deixar as ferramentas certas de lado, no movimento correto e no tempo necessário para que a forma vá ganhando vida. Para que eu possa ir ganhando vida ao conhecer meus abismos e meus sóis.
O mais interessante é que meu processo segue o mesmo: música nos fones, devaneios abstratos e elaboração até a forma ter corpo.
Além desse tipo de texto, gosto também de escrever ficção e contos. Ainda não possuem a coragem necessária para conhecerem a luz que os aguarda fora da caixinha. Porém, quem sabe um dia?
A poesia também já teve seus momentos de titular em minha vida. Para as dificuldades em transmitir e traduzir o furacão que tirava tudo do lugar dentro de mim, a narrativa abstrata ganhava força. Apelava à sensação, como “o frio outonal que carrega o céu azul se senta ao meu lado e começa seu monólogo”. Sim, bem abstrato, mas que traduzia, em partes, a bigorna que puxava meu coração ao solo. Sem dúvida a música também tem uma grande parcela de culpa em conseguir traduzir muito bem o que tentava sair pelos poros.
Em um exercício de elaboração, publiquei a seguinte frase:
A reposta que tive foi melhor ainda:
o passado não tem porta não tem uma cortininha daquelas de cordinha de madeira sabe que você passa e faz barulhinho? - Denise Rossi
Essa subjetividade nas frases em dar corpo ao invisível traduz o que é a escrita para mim.
Para não me alongar muito, deixo mais um pouquinho sobre o que é escrever:
"escrevemos porque tem algo que está vazando, então se fala pelas palavras" -
Por hoje é isto. Boa semana, boa batalha e volte sempre :)
Beijos,
Lucas.
Nos meus fones
Estou simplesmente apaixonado por Can’t Swim e seu novo disco, o Thanks but No Thanks. Ouçam Nowhere, Ohio e met u the day the world ended.
Graças ao aleatório, conheci a Wait for Me do Kings of Leon. Coisa fina!
Para começar a semana com um toque mais leve, ouça Come Away With Me de Norah Jones.
Nas leituras
Sigo devorando as páginas de A Natureza da Mordida. Com cerca de 68% da leitura realizada, trago alguns trechos para ilustrar ainda mais a news dessa semana:
Subitamente, avisto pequenas ilhas de alegria num mar de dor. As tais ilhas aparecem como quem diz que alguma coisa, apesar de tudo, foi salva. São alegrias das quais não quero me desfazer. Fossem só dor nossas lembranças, nos desapegaríamos. Mas, entranhadas nelas, resistem as pequeninas e ensolaradas ilhas sabotando todo um mar de motivos para esquecer.
Carla Madeira, A Natureza da Mordida
O que você não tem mais que te entristece tanto?
Carla Madeira, A Natureza da Mordida
Quem pode acreditar na literatura sem sofrimento?
Carla Madeira, A Natureza da Mordida
Semana que vem eu trago mais. Não há como ser impactado por tamanha emoção nas palavras e sair ileso.
Nas telas
Assisti à A Mulher de Preto. Já havia tido contato há um tempo, mas decidi revisitar.
O filme, em sua totalidade, fala sobre o luto. O personagem principal busca uma fuga do abismo aberto dentro de si após perder sua mulher para um parto de risco. Na narrativa, a mulher de preto é a tristeza personificada e toda a trajetória do protagonista é sobre enfrentar e reconhecer a tristeza. Aceitar o imutável. Aceitar que somos orgânicos.
Lucas, que bonito o significado da escrita pra você! Acho que você descreveu perfeitamente. Me identifiquei. É exatamente isso!
Esta relação de escrita e texto é engraçada, porque às vezes olho para meus textos de 13 anos e penso que eu tinha muitas ideias boas e também muitos equívocos. Acho que assim como todas as outras profissões a prática sempre aperfeiçoa o que é literal ou não. Eu mesmo, ando numa fase de escrever contos e acho que tenho melhorado o desenvolvimento do texto e das histórias que não param de surgir na cabeça a cada instante. Iclusive, ótimo texto e ótima recomendação de música!