Olá, como vai?
Faz tempo que não apareço por aqui, eu sei. Sinto muito por ter construído uma ponte maior do que eu imaginava ter planejado. Construir pontes também é sobre saber se a distância fica boa para ambas as pontas.
Bom, cá estou, num dia randomizado, sendo carregado pela vontade de escrever e me expressar.
Agradeço ao
e à por me manterem em sã consciência com suas edições.Andei proseando muito sobre nossos pequenos manuais de sobrevivência, nossa rotina mais pura para que o dia comece agradável e termine pacífico.
Como seres pensantes, criamos maneiras de facilitar nosso dia a dia. Eu, por exemplo, já deixo tudo separado da noite anterior para o dia seguinte e, para ganhar tempo, até a cafeteira fica configurada para passar o café exatamente 4:45 da manhã.
Pequenos rituais trazem um conforto extra de, veja, pensar que temos que o controle das coisas.
Claro que tudo tem seus limites, mas quem sou eu para citar e delimitar o seu? Precisamos estar atentos aos excessos e, também, suas faltas.
A solidão que nos acompanha
Lendo A Gente Mira no Amor e Acerta na Solidão,
tem uma conversa franca com o leitor a respeito do amor. Em suas páginas, a autora faz questão de rimar amor com solidão e, de início gera estranheza e alguns narizes tortos, no entanto, confesso que faz sentido em sua totalidade.Ao acompanhar as páginas, entendi o quanto eu senti falta da psicanálise desde a minha formação. O mais curioso foi sentir que ela nunca saiu de mim. E não saiu mesmo. Só andou se tornando um olhar natural da vida e de suas questões sociais, políticas e coletivas.
É muito curioso o fato do estar só. Eu, por exemplo, tendo a não contemplar tanto minhas questões e busco os mecanismos de fuga. Me enfiar num livro, num joguinho besta no Nintendo Switch, desocupar a cabeça de pensamentos e armar as barracas de músicas, e outras atividades que geram nuvens cujas lançam sombras e fazem essas questões das quais fujo, parecem maiores e mais aterrorizantes do que são.
Tendemos a negar nossa dor. Não queremos olhar para o vazio. E, o que é o vazio? O entendo como parte e não como falta. A solidão precisa ser trabalhada também, a solidão não deveria ser considerada como a falta de..., mas sim como parte de. Isso nos torna completos. A máxima nascemos sozinhos e morremos sozinhos se trata de nascermos conosco e morrermos conosco, mesmo rodeados de pessoas. Só nós vivemos conosco por 24h/dia.
É por esse fato que temos nossos próprios manuais de sobrevivência, nossos ritmos, nossas manias. Vejo que precisamos sentir, de alguma forma, que estamos no controle de assuntos específicos diariamente para compensar a falta. Essa necessidade em se agarrar ao que é palpável e menos orgânico, já que tudo o que é orgânico tem prazo de validade para deixar esse mundo.
A fantasia se choca com a realidade e se mistura em um tornado que está longe de ser como água e óleo. Nós, neuróticos, tendemos a dar um valor muito grande à nossa voz interior, essa mesma que está acompanhando a leitura, e deixar que ela lance inverdades repetidamente. Quando cometemos um erro, um deslize que seja, o martírio começa e o açoite mental segue o caminho do calvário até acreditarmos que a realidade se resume a isso e que realmente não somos boas pessoas.
É complicado ir contra ao nosso agiota interno, nosso espelho que parece saber mais de nós do que nós mesmos. É nesse momento que o vazio se faz presente.
O vazio como preenchimento
Those wounds won't lick themselves.1
Mesmo sendo seres sociáveis, precisamos do nosso canto, do nosso cheiro, de nossa intimidade para lamber nossas feridas, limpar e fazer o processo de cura progredir.
É na solidão, veja solidão como estar só, onde conseguimos ter clareza sobre algumas questões. Há a necessidade de desaguar, deixar a cachoeira de pensamentos passar por baixo da ponte sólida que somos. Se não há vazão, há risco de rachaduras, bolor e desgaste.
O fluxo de pensamentos anda maior do que há 10 anos. Estamos, basicamente, conectados em 90% do tempo e tudo o que consumimos, devoramos com os olhos, busca uma gaveta mental para ser arquivada. Infelizmente nosso cérebro não tem processo de evacuação. Assim como cuidamos da alimentação, há a necessidade de saber o que consumir intelectualmente. Escolha o que quer ver e alimentar, não se renda totalmente ao algoritmo. Quanto menor nossa possibilidade de escolha, maior nossa falta de protagonismo, maior a angústia pela falta de controle e maior o incômodo durante os processos de solidão, já que é nesta lacuna que somos o maquinista de nossa locomotiva.
E errei por não saber lidar com tanta solidão
Que insiste em me abraçar
Vou até aonde der
Aguento pra não cair em vento2
Aguentar a solidão, a aprender, a abraçar, para ir até onde der, mas aguentando firme para não se permitir ser levado pelos ventos sem bússola. Aprender a encarar o abismo é necessário, não para se transformar nele, mas sim para compreender que ele faz parte de nossa trilha, do nosso dia, de nossa vida.
É que eu não quero mais andar na chuva
Cansei de me molhar
É tão triste me ver sozinho
Porque eu penso demais
Eu penso tanto3
Cansar de se molhar em seus próprios pensamentos, sozinho, pensando e pensando... Em uma espiral que não há vislumbre de fim, apenas trovões, raios, ventania e frio. Aceitar a solidão é aceitar que a chuva vai molhar, vai escorrer e vai secar. Esse processo é solitário, arrepia e cansa. Há situações que precisamos tomar a rédea e resolver. Depositar a responsabilidade no outro, por mais inconsciente que possa ser, necessita de atenção para não gerar, e espelhar, sua frustração no sujeito externo. Há feridas que nós precisamos tratar, pois só nós sabemos onde dói e porquê dói.
I'd rather walk alone
Than stand in a row
I'd line up everything I own
Decide what should stay and what should go4
No fim, tomar as rédeas da vida deve ser isso. Escolher.
As escolhas que fazemos para nós, para o outro, para com o mundo e seus contextos. Escolher caminhar sozinho, ao invés de se manter em uma fileira, no coletivo, alinhando os exércitos internos e decidindo o que deve ficar e o que deve partir de nós.
Decidir quais pensamentos e fluxos devem ficar e quais devem partir. Escolher qual dor tratar primeiro, qual caminho trilhar. Escolher como fazer o bem ao próximo, como amar o outro, como amar a si mesmo.
Escolher caminhar sozinho é fazer as pazes com seu espelho. É debater sobre as rosas e seus espinhos, sobre a beleza e a feiura da vida, que gargalha histericamente para cada tropeço que damos.
Escolher é viver.
Por hoje é isto. Bom fim de semana, boa batalha e volte sempre :)
Beijos,
Lucas.
A solidão é e sempre foi uma questão pra mim, sou muito dependente e isso me assombra. Acho que vou ler esse livro que você citou. Amei seu texto!!!
Construir pontes... Parei nessa metafora e nela permaneci a refletir por um tempo ... Obrigada pela linda possibilidade de reflexão e inclusive, que as Pontes construídas possam ser usadas para seguir, mas também, quando puder para voltar e trazer mais um pouco de seus pensamentos. 🙏